Igreja anuncia Deus amigo do homem, diz Papa

Bollettino della Sala Stampa della Santa Sede
(tradução de CN Notícias)

 O Papa Bento XVI ressaltou que para encontrar respostas adequadas aos desafios da emergência educativa, é preciso consertar um falso concetio de autonomia do homem e, também, repropor a natureza e a Revelação como fontes que orientam o caminho humano.

"A nossa resposta é o anúncio do Deus amigo do homem, que em Jesus se fez próximo de cada um", disse.

As afirmações foram ditas durante audiência aos bispos da Conferência Episcopal Italiana (CEI), reunidos em Assembleia Geral, na manhã desta quinta-feira, 27, na Sala do Sínodo.

A seguir, leia o discurso do Santo Padre na íntegra

Venerados e queridos Irmãos,

no Evangelho proclamado no domingo passado, Solenidade de Pentecostes, Jesus nos prometeu: "O Paráclito, o Espírito Santo, que o Pai enviará em meu nome, ensinar-vos-á todas as coisas e vos recordará tudo o que vos tenho dito" (Jo 14, 26). O Espírito Santo guia a Igreja no mundo e na história. Graças a esse dom do Ressuscitado, o Senhor permanece presente no decorrer dos eventos; é no Espírito que podemos reconhecer em Cristo o sentido dos acontecimentos humanos. O Espírito Santo nos faz Igreja, comunhão e comunidade incessantemente convocada, renovada e relançada em direção ao cumprimento do Reino de Deus. Está na comunhão eclesial a raiz e a razão fundamental do vosso convergir e do meu estar novamente convosco, com alegria, por ocasião deste encontro anual; é a perspectiva com a qual vos exorto a afrontar os temas do vosso trabalho, no qual sois chamados a refletir sobre a vida e sobre a renovação da ação pastoral da Igreja na Itália. Sou grato ao Cardeal Angelo Bagnasco pelas corteses e intensas palavras que me dirigiu, fazendo-se intérprete dos vossos sentimento: o Papa sabe que pode contar sempre com os bispos italianos. Através de vós, saúdo as comunidades diocesanas confiadas aos vossos cuidados, enquanto estendo o meu pensamento e a minha proximidade espiritual a todo o povo italiano.

Fortalecidos pelo Espírito, em continuidade com o caminho indicado pelo Concílio Vaticano II, e em particular com as orientações pastorais do decênio recém-concluído, tendes escolhido assumir a educação como tema importante para os próximos dez anos. Tal horizonte temporal é proporcional à radicalidade e amplitude da questão educativa. E me parece necessário andar em direção às raízes profundas dessa emergência para encontrar também as respostas adequadas a esse desafio. Eu aqui ressalto especialmente duas. Uma raiz essencial consiste - me parece - em um falso conceito de autonomia do homem: o homem deveria desenvolver-se somente por si mesmo, sem imposições de parte dos outros, os quais poderiam assistir o seu autodesenvolvimento, mas não entrar neste desenvolvimento. Na realidade, é essencial para a pessoa humana o fato de que se torna ela mesma somente a partir do outro, o "eu" torna-se si mesmo somente a partir do "tu" e do "vós", é criado para o diálogo, para a comunhão sincrônica e diacrônica. E somente o encontro com o "tu" e com o "nós" abre o "eu" a si mesmo. Por isso a assim chamada educação antiautoritária não é educação, mas renúncia à educação: assim não nos permite saber o quanto somos devedores aos outros, a este "tu" e "nós" nos quais se abre  o "eu" a si mesmo. Então um primeiro ponto me parece este: superar esta falsa ideia de autonomia do homem, como um "eu" completo em si mesmo, enquanto torna-se "eu" também no encontro com o "tu" e com o "nós".

A outra raiz da emergência educativa eu a vejo no ceticismo e no relativismo ou, com palavras mais simples e claras, na exclusão das duas fontes que orientam o caminho humano. A primeira fonte deveria ser a natureza, seguida pela Revelação. Mas a natureza é considerada hoje como uma coisa puramente mecânica, de tal forma que não contém em si algum imperativo moral, alguma orientação de valores: é algo puramente mecânico, e então não possui alguma orientação do ser mesmo. A Revelação é considerada ou como um momento do desenvolvimento histórico, então relativo como todo o desenvolvimento histórico e cultural, ou - costuma-se dizer - embora revelação, não compreende conteúdos, somente motivações. E silenciadas essas duas fontes, a natureza e a Revelação, também a terceira fonte, a história, não fala mais, porque também a história torna-se somente um aglomerado de decisões culturais, ocasionais, arbitrárias, que não valem para o presente e para o futuro. Fundamental é, então, re-encontrar um conceito verdadeiro da natureza como criação de Deus que fala a nós; o Criador transmite o livro da criação, fala a nós e nos mostra os valores verdadeiros. E assim também, pois, re-encontrar a Revelação: reconhecer que o livro da criação, no qual Deus nos dá as orientações fundamentais, é decifrado na Revelação, é aplicado e feito próprio na história cultural e religiosa, não sem erros, mas de uma maneira substancialmente válida, sempre de novo a se desenvolver e purificar. Assim, neste "concerto" - por assim dizer - entre criação decifrada na Revelação, concretizada na história cultural que sempre vai adiante e na qual nós re-encontramos sempre mais a linguagem de Deus, abrem-se também as indicações para uma educação que não é imposição, mas realmente abertura do "eu" ao "tu", ao "nós" e ao "Tu" de Deus.

Então as dificuldades são grandes: re-encontrar as fontes, a linguagem das fontes, mas, por saber do peso dessas dificuldades, não podemos ceder à desconfiança e à resignação. Educar já não é mais tão fácil, mas não devemos nos render: falharemos no mandato que o Senhor nos confiou, chamando-nos a apascentar com amor a sua grei. Despertemos acima de tudo nas nossas comunidades aquela paixão educativa, que é uma paixão do "eu" pelo "tu", pelo "nós", por Deus, e que não se resolve através de uma didática, em um conjunto de técnicas e tampouco na transmissão de princípios áridos. Educar é formar as novas gerações, para que saibam entrar em contato com o mundo, fortalecidos por uma memória significativa que não é somente ocasional, mas acrescida da linguagem de Deus que encontramos na natureza e na revelação, de um patrimônio interior compartilhado, da verdadeira sabedoria que, enquanto reconhece o fim transcendente da vida, orienta o pensamento, os afetos e o juízo.

Os jovens carregam uma semente no seu coração, e esta semente é uma busca de signficados e relacionamentos humanos autênticos, que ajudam a não se sentir sozinhos diante dos desafios da vida. É desejo de um futuro, que torna-se menos incerto através de uma companhia segura e confiável, que se aproxima de cada um com delicadeza e respeito, propondo valores saudáveis a partir dos quais crescer rumo a objetivos elevados, mas realizáveis. A nossa resposta é o anúncio do Deus amigo do homem, que em Jesus se fez próximo de cada um. A transmissão da fé é parte irrenunciável da formação integral da pessoa, porque em Jesus Cristo se realiza o projeto de uma vida de sucesso: como ensina o Concílio Vaticano II, "aquele que segue Cristo, o homem perfeito, torna-se também ele mais homem" (Gaudium et Spes, 41). O encontro pessoal com Jesus é a chave para intuir a relevância de Deus na existência cotidiana, o segredo para manifestá-la na caridade fraterna, a condição para levantar-se sempre das quedas e mover-se constantemente à conversão.

A missão educativa, que tendes assumido como prioritária, valoriza sinais e tradições, dos quais a Itália é bastante rica. Necessita de lugares credíveis: acima de tudo a família, com o seu papel peculiar e irrenunciável; a escola; horizonte comum para além de opções ideológicas; a paróquia, "fonte da aldeia", lugar e experiência que inicia a fé no tecido das relações cotidianas. Em cada um desses ambientes é decisiva a qualidade do testemunho, via privilegiada da missão eclesial. O acolhimento da proposta cristã passa, de fato, através da relação de proximidade, lealdade e confiança. Em um tempo no qual a grande tradição do passado arrisca-se a permanecer letra morta, somos chamados a nos aproximarmos de cada um com disponibilidade sempre nova, acompanhando-o no caminho de descoberta e assimilação pessoal da verdade. E fazendo isso também nós podemos redescobrir de modo novo as realidades fundamentais.

A vontade de promover uma renovada temporada de evangelização não oculta as feridas com que as comunidades eclesiais são assinaladas, pela debilidade e pecado de alguns de seus membros. Essas humilde e dolorosa admissão não deve, no entanto, fazer esquecer o serviço gratuito e apaixonado de tantos crentes, a começar pelos sacerdotes. O ano especial a eles dedicado desejou constituir uma oportunidade para promover a renovação interior, condição para um mais incisivo empenho evangélico e ministerial. Além disso, nos ajuda também a reconhecer o testemunho de santidade de muitos - a partir do exemplo do Cura d'Ars - que se entregam sem reservas para educar à esperança, à fé e à caridade. Sob essa luz, aquilo que é motivo de escândalo deve traduzir-se para nós como uma chamada a uma "profunda necessidade de reaprender a penitência, de aceitar a purificação, de aprender por um lado o perdão, mas também a necessidade de justiça" (Bento XVI, Entrevista do Papa a jornalistas no voo entre Itália e Portugal, 11 de maio de 2010).

Queridos irmãos, vos encorajo a percorrer sem exitação a estrada do empenho educativo. O Espírito Santo vos ajude a não perder mais a confiança nos jovens, vos impinja a andar ao seu encontro. Vos leve a frequentar os ambientes de vida, inclusive aqueles constituídos pelas novas tecnologias de comunicações, que atualmente permeiam a cultura em todas as suas expressões. Não se trata de adequar o Evangelho ao mundo, mas de tirar do Evangelho aquela perene novidade, que permite em todos os tempos encontrar as formas adequadas para anunciar a Palavra que não passa, fecundando e servindo à existência humana. Tornemos, então, a propor aos jovens a medida alta e transcendente da vida, entendida como vocação: chamados à vida consagrada, ao sacerdócio, ao matrimônio, saibam responder com generosidade ao apelo do Senhor, porque somente assim poderão colher aquilo que é essencial para cada um. A fronteira educativa constitui-se como lugar para uma ampla convergência de intenções: a formação das novas gerações não pode, de fato, deixar de estar no coração de todos os homens de boa vontade, interpelando a capacidade da sociedade inteira de assegurar referências confiáveis para o desenvolvimento harmônico das pessoas.

Também na Itália a presente temporada é marcada por uma incerteza de valores, evidente no cansaço de tantos adultos a ter fé em seus compromissos: isso é indício de uma crise cultural e espiritual, tão grave quanto aquela econômica. Seria ilusório - isso desejo destacá-lo - pensar em contrastar uma ignorando a outra. Por essa razão, enquanto renovo o apelo aos responsáveis da coisa pública e aos empreendedores a fazer tudo o quanto seja possível para atenuar os efeitos da crise ocupacional, exorto todos a refletir sobre os pressupostos de uma vida boa e significativa, que fundam aquela autoridade que somente educa e retorna às verdadeiras fontes de valores. A Igreja, de fato, traz no coração o bem comum, que nos empenha a compartilhar recursos econômicos e intelectuais, morais e espirituais, aprendendo a afrontar conjuntamente, em um contexto de reciprocidade, os problemas e os desafios dos Países. Essa perspectiva, amplamente desenvolvida no vosso recente documento sobre Igreja e Mezzogiorno, encontrará ulterior aprofundamento na próxima Semana Social dos católicos italianos, prevista para outubro em Reggio Calabria, onde, em conjunto com as melhores forças do laicado católico, vos empenhareis a declinar uma agenda de esperança para a Itália, para que "as exigências da justiça tornem-se compreensíveis e politicamente realizáveis" (Deus Caritas est, 28). O vosso ministério, queridos Irmãos, e a vivacidade das comunidades diocesanas a cuja guia fostes colocados, são as melhores garantias de que a Igreja continuará responsavelmente a oferecer o seu contributo ao crescimento social e moral da Itália.

Chamado pela graça a ser pastor da Igreja universal e da esplêndida cidade de Roma, levo constantemente comigo as vossas preocupações e as vossas expectativas, que nos dias passados depositei - com aquelas de toda a humanidade - aos pés de Nossa Senhora de Fátima. A Ela vai a nossa oração:

Virgem Mãe de Deus e nossa Mãe caríssima, "a tua presença faça reflorescer o deserto das nossas solidões e brilhar o sol sobre as nossas trevas, faça voltar a calma depois da tempestade, para que todo o homem veja a salvação do Senhor, que tem o nome e o rosto de Jesus, refletida nos nossos corações, para sempre unidos ao vosso! Assim seja!" (Oração de Bento XVI na consagração dos sacerdotes à Virgem Maria, Fátima, 12 de maio de 2010).

De coração vos agradeço e vos abençoo.



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