Na vida concreta, evangelização e catequese se misturam. Mas, para
torná-las mas frutuosas, é possível e necessário distinguir, pelo menos do
ponto de vista didático, estas duas
expressões da única dinâmica da fé. A evangelização é o anúncio inculturado
e atualizado da Boa Notícia de Deus, assim como foi experimentada e proposta
por Jesus de Nazaré. E a catequese é, etimologicamente, fazer com que o
Evangelho produza eco, é o aprofundamento mais sistemático e articulado deste
anúncio substancial.
O Instrumentum Laboris do
próximo Sínodo dos Bispos observa
que, não sendo uma ação individual mas comunitária e ecleisal, a transmissão da fé
não deveria se preocupar em encontrar estratégias comunicativas eficazes nem com
a seleção dos destinatários, mas refletir adequadamente sobre o próprio sujeito
da evangelização (cf. IL, § 39). Ou
seja, a Igreja deve refletir e encontrar
em si mesma parte das causas que dificultam a aceitação do Evangelho e o
seu enraizamento na cultura atual.
Esta é uma tarefa urgentíssima e exigente, mas chamar isso de ‘nova
evangelização’ não parece apropriado. A palavra que a Igreja dirige a si mesma,
aos diferentes grupos que a compõem, não se chama propriamente evangelização, mas catequese. É verdade que alguém deve repropor permanentemente a Boa Notícia de Jesus Cristo aos membros
da Igreja, mas isso configura um processo
permanente de educação da fé, com diferentes etapas e recursos variados. E
quando se trata de remover os obstáculos que a vida dos fiéis, mas também as velhas
tradições e pesadas estruturas, interpõem à credibilidade do seu anúncio, o que
se necessita não é de evangelização mas de conversão
pessoal e de mudança estrutural, e esse é um percurso que também merece ser
pensado com atenção e profundidade. Sendo verdade que a catequese e a conversão
não se reduzem à simples escolha de estratégias, também o é que sem caminhos, percursos ou instrumentos
adequados a Palavra de Deus não produz eco na vida e na sociedade, e a conversão
permanente e necessária da Igreja não passa de intenção vazia e proposta
escapista.
No Instrumentum Laboris pede-se
também que os Bispos Sinodais se interroguem seriamente se a falta de
fecundidade da evangelização e da catequese do nosso tempo não seria acima de
tudo um problema eclesiológico e espiritual. Poderia acontecer que os métodos
usados pela catequese, no contexto de uma cultura secularizada, não estejam
levando a uma fé madura e à sua transmissão. E recomenda-se que os Bispos reflitam
sobre como desenvolver uma catequese que articule convenientemente fidelidade à
revelação e fidelidade à pessoa humana culturalmente situada; que seja integral
na transmissão fiel do núcleo da fé e, ao mesmo tempo, saiba falar às pessoas
de hoje, escutando suas interrogações e animando suas buscas (cf. IL, § 104).
Esta é uma questão absolutamente fundamental, mas os problemas começam
exatamente na idéia de pessoa humana e no conceito de fé e de revelação que a
Igreja veicula! Quem ousar entrar nesse campo se defrontará com ‘minas’
espalhadas por todos os lados, com visões abstratas e tremendamente moralistas,
legalistas e institucionalizadas. Mesmo que alguns discursos queiram mostrar
diversamente, a prática hegemônica da hierarquia católica demonstra que ela não
se dá bem com pessoas humanas e comunidades eclesiais maduras, autônomas,
questionadoras, criativas. Da mesma forma, teme projetos de catequese e de
evangelização que procuram encarnar a Boa Notícia de Jesus Cristo nas buscas e
lutas humanas de hoje e traduzí-la numa linguagem minimamente compreensível ao
nosso tempo.
Se a fé dos fiéis católicos e das comunidades eclesiais é infantil, imatura
e impotente, isso não se deve prioritariamente à sua falta de boa vontade ou
aos seus limites. O problema é estrutural, e tem sua origem numa instituição
eclesiástica que prefere repetir fórmulas antigas e vazias de sentido e tem
medo da inovação; que canoniza os fiéis obedientes e submissos e estigmatiza
aqueles que questionam e propugnam por novas expressões da fé e por sua
encarnação na cultura atual, assim como pela renovação de estruturas
eclesiásticas anacrônicas e às vezes anti-evangélicas.
Itacir Brassiani msf
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