Via Padre Paulo Ricardo - Christo Nihil Praeponere
Os cristãos confessam, desde sempre, que Jesus Cristo é Deus. São
João escreve que a Palavra, que "estava junto de Deus" e "era
Deus" ( Jo 1,
1), "se fez carne e veio morar entre nós" (Jo 1, 14). São numerosos
os discursos de Cristo em que Ele deixa claro ser muito mais que um simples
homem – todo o Evangelho de São João está permeado de declarações desse teor –,
sendo este o motivo alegado pelos judeus para condená-Lo à morte: "Não queremos
te apedrejar por causa de uma obra boa, mas por causa da blasfêmia. Tu, sendo apenas um homem, pretendes ser
Deus" (Jo 10,
33).
Se, naquela época, até quem não seguia Nosso Senhor tinha clara
consciência da grandeza do que Ele anunciava, hoje, muitos – atribuindo a si o
apelido de "cristãos" – têm advogado, covardemente, uma
"terceira opção": ao invés de rejeitar ou aceitar de vez a mensagem
do Evangelho, recorrem a uma leitura distorcida das Escrituras, reduzindo a
figura de Jesus à de "um grande profeta, um mestre de sabedoria, um modelo
de justiça" [1], cujas máximas valeriam, no máximo, como "guias
motivacionais". Para essas pessoas, a Bíblia não é o livro que traz a
revelação de Deus, mas tão somente um "manual de autoajuda"; e a
Igreja não é um edifício espiritual, mas uma construção puramente material,
voltada apenas aos cuidados e necessidades deste mundo.
Antes de mais nada, importa denunciar o grave equívoco desse ponto
de vista, que não pode ser aceito sem se cometer um grande e grave atentado à
razão. Se Jesus não é "o Cordeiro de Deus, que tira o pecado do
mundo" ( Jo 1,
29), nem "o pão que desceu do céu" e que dá a vida eterna (Jo 6, 41), nem "a
porta das ovelhas" (Jo 10,
7) – realidades que ninguém usaria senão para se referir à divindade –, então,
ou é um mentiroso, que queria enganar os outros, ou um louco, que não sabia
sequer quem ele mesmo era. Ora, que grandeza pode haver na mentira e na
loucura?Ou Jesus é Deus, ou
não é nada. Et
tertium non datur [2].
É preciso reconhecer, porém, como é cômodo relegar Nosso Senhor à
posição de "apenas um homem". Se é assim, as suas palavras realmente
não vinculam, nem obrigam ninguém a nada; são apenas reflexões morais e
sociais, como as de qualquer pensador antigo. Daria no mesmo, então, citar
Confúcio, Dalai Lama, Buda, Chico Xavier ou Jesus Cristo. Afinal, se são todos
homens, com igual tratamento deveriam ser acolhidas suas mensagens: como
palavras humanas.
A prática da Igreja primitiva, no entanto, atesta: os discípulos
sempre creram que pregavam uma doutrina autenticamente divina. Em carta a
Tessalônica, por exemplo, o Apóstolo agradece a Deus "sem cessar, porque,
ao receberdes a palavra de Deus que ouvistes de nós, vós a recebestes não como palavra humana,
mas como o que ela de fato é: palavra de Deus, que age em vós
que acreditais" (1
Ts 2, 13). Tanto ontem, como hoje, a fé católica não mudou.
Diante das vozes enganadoras que pretendem reduzir a imagem de Cristo à de um
chefe religioso qualquer, urge dizer "não": a boa-nova do Evangelho
não é "palavra humana", mas, verdadeiramente, "palavra de
Deus".
Foi o que disse o Cardeal Joseph Ratzinger – depois, Papa Bento
XVI –, na virada do novo milênio, quando
publicou a declaração Dominus
Iesus, "sobre a unicidade e a universalidade salvífica de
Jesus Cristo e da Igreja". Em 2000 – ou, "em pleno século XXI",
diriam os mais escandalizados –, a Igreja recordava que "os homens (...)
só poderão entrar em comunhão com Deus através de Cristo" [3]. À época, os
meios de comunicação "rasgaram as vestes", acusando São João Paulo II
e o Vaticano de arrogância e intolerância religiosa. É que, com a Dominus Iesus, a Igreja
denunciava taxativamente as opiniões mundanas a respeito de Jesus, das quais a
mídia moderna se faz porta-voz tão ardorosa:
"Na reflexão teológica contemporânea é frequente fazer-se uma
aproximação de Jesus de Nazaré, considerando-o uma figura histórica especial,
finita e reveladora do divino de modo não exclusivo, mas complementar a outras
presenças reveladoras e salvíficas. O Infinito, o Absoluto, o Mistério último
de Deus manifestar-se-ia assim à humanidade de muitas formas e em muitas
figuras históricas: Jesus de Nazaré seria uma delas." [4]
Nesse sentido, a fé católica é profundamente intolerante,
sobretudo, porque é fiel à palavra de Cristo, que não temeu apontar a si mesmo
como "o caminho, a verdade e a vida", fora do qual ninguém pode ir ao
Pai ( Jo 14,
6). Essa expressão - dita pelo mesmo Jesus que perdoou os pecadores
arrependidos, curou os doentes e saciou os pobres - mostra como a misericórdia divina
está profundamente unida à verdade da Sua mensagem, que repele todo erro, toda
mentira… e toda falsa religião.
Ao argumento dos judeus de que Jesus, sendo apenas um homem, se
fazia Deus, a Igreja responde, em consonância com dois mil anos de Tradição e
Magistério: Jesus não foi um homem que pretendeu ser
Deus. Ao contrário, Ele foi Deus, que, não se apegando ciosamente à natureza
divina, "despojou-se, assumindo a forma de escravo e tornando-se
semelhante ao ser humano" (Fl 2,
7). Eis o que creem os cristãos.
Por Equipe Christo Nihil
Praeponere
Referências
- Papa Francisco, Angelus, 24 de agosto de 2014
- Sobre isso, cf. RC 221: Como provar que Jesus é Deus?
- Dominus Iesus, 12
- Ibidem, 9
Fonte: https://padrepauloricardo.org/blog/ou-jesus-e-deus-ou-nao-e-nada
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